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Brasil abaixo de zero

Esquiador brasileiro Rhaick Bonfim
O esquiador Rhaick Bonfim realiza sonho olímpico alimentado desde que começou a treinar no projeto social "Ski na Rua", em São Paulo. COB

O Brasil dos esportes de verão e do calor está dando as caras nos Jogos de Inverno e no frio. Esqueçam o futebol, o vôlei e os esportes conhecidos e fáceis de falar. Desta vez, há brasileiros praticando biatlo, curling, esqui cross country, monobob, skeleton e snowboardcross. 

O Brasil nunca teve tantos representantes em tantas modalidades como agora, nos Jogos Olímpicos de Inverno da Juventude, que acontecem até essa quarta-feira, dia 22. Na primeira edição, eram dois atletas; na segunda, dez. Nesta terceira edição dos jogos, que acontece em Lausanne, a sede principal, e St. Moritz, a subsede, há 12 jovens brasileiros competindo em seis modalidades.

Ganhar medalha parece ser o de menos, porque essa ainda não é muito a nossa praia e, além do mais, os adversários são craques nos esportes de inverno. O que o Brasil quer não é só “o importante é competir” nas baixas temperaturas, mas evoluir.

Treinando no asfalto

Uma das atletas presentes é Taynara Rodrigues da Silva, de 17 anos, a primeira brasileira a competir em duas modalidades diferentes (biatlo e esqui cross-country) nos Jogos Olímpicos de Inverno da Juventude. Coube a ela também outro título: foi umas das atletas a carregar a bandeira do Brasil na cerimônia de abertura, em Lausanne.

Jovem em frente à Vila Olímpica coberta de bandeiras
Taynara em frente à Vila Olímpica, em Lausanne: “Quando me deram a notícia de que seria uma das porta-bandeiras, fiquei mega feliz. Carregar a nossa bandeira foi muito importante. É emocionante representar o Brasil, que tem tão poucos atletas de esporte de neve”. Valéria Maniero

Taynara teve problemas durante a prova de 10 Km do biatlo, modalidade que combina esqui cross country e tiro esportivo, no dia 11, mas conseguiu ir até o fim (92ª colocação entre 97 atletas).

“Eu já conhecia a pista, mas na terceira volta eu caí e machuquei a perna. Mesmo com muita dor, terminei a minha prova. Não podia desistir, já que estava quase acabando e treinei muito para estar aqui. Se eu desistisse ali, todo o trabalho que eu tinha feito teria sido jogado fora. Eu dei o meu melhor na pista”, conta ela, que ainda participará de outras provas.

Nascida em Boa Vista, em Roraima, Taynara contou para o swisssinfo.ch como são os treinos em Jundiaí, cidade onde mora e estuda (começa este ano o terceiro ano do ensino médio): “A gente treina no asfalto com equipamento adaptado, com duas rodinhas e bastão. Treino o Rollerski, que é a simulação do esqui, três vezes por semana. Quando a gente chega para treinar aqui, na neve, se adapta rápido”, explica ela, que começou a praticar o esporte influenciada por amigos.  

“O principal não é ganhar, mas representar o Brasil”

Michael Velve, de 16 anos, que como os outros três atletas do curling moram em Vancouver, no Canadá, falou com o swissinfo.ch sobre a importância de representar o Brasil aqui na Suíça. “É uma honra representar o país. Me lembro de eu deitado na cama pensando, sonhando: eu quero isso muito. Era um sonho”, diz Michael, que é filho de uma brasileira e de um canadense e fala português com desenvoltura e sotaque, só errando uma coisinha aqui e outra ali. Não foi fácil para o atleta, que joga curling há dez meses, conseguir uma vaga no time. Ele teve que trabalhar duro, mas garante que valeu a pena. E, agora, Michael não pensa em parar.

“Eu sou o mais novo jogador do time e precisava aprender tudo muito rápido. Então, estava praticando cinco, seis vezes por semana de duas a três horas. O meu interesse, primeiro, eram os Jogos da Juventude, mas agora tenho uma paixão pelo curling e quero continuar e representar o Brasil em tudo o que eu puder”, diz ele, que tem parentes no Rio de Janeiro e em Niterói.  

Time brasileiro de curling
O time de curling do Brasil encerrou sua participação sem ganhar nenhuma partida, perdendo para Alemanha (15 a 1), China (14 a 1), Dinamarca (12 a 3), Hungria (13 a 2) e Suíça (10 a 2), mas foi a primeira vez que uma equipe brasileira pontuou em todas as partidas de uma competição internacional. COB

E um dos pontos foi especialmente comemorado: o da partida contra a China, quando o Brasil fez um único ponto. Naquele momento, a alegria do time chegou às arquibancadasLink externo, contagiando as pessoas que assistiam à partida na Arena Champery. 

“Eu corri lá na pista, levantei a mão e gritei: Brasil! O principal não é ganhar, mas representar o país”, diz Michael, ciente da dificuldade que é jogar contra times com mais experiência e entrosamento. O do Brasil, para se ter uma ideia, só joga como time há seis meses e esta foi a primeira competição internacional dos quatro integrantes juntos. Além de Michael, o time brasileiro foi representado por Vitor Melo, Gabi Rogic Farias e Letícia Cid.

“Ski na rua”

Em 2013, Rhaick Bonfim, hoje com 17 anos, começou a praticar o Rollerski, modalidade que simula o ski cross country no asfalto. Foi no projeto social Ski na RuaLink externo, ONG do atleta olímpico Leandro Ribela, que tem como objetivo promover a inclusão social pelo esporte. Ele ainda treina lá. E sete anos depois, Rhaick está competindo pelo Brasil nos Jogos Olímpicos de Inverno da Juventude.  

“Desde pequeno, era meu sonho ir para as Olimpíadas e hoje estou realizando esse sonho e também o de representar o Brasil. O esporte, para mim, significa amizade, igualdade, muita coisa boa. Se não fosse o esporte, não sei o que seria de mim”, diz ele, que mora na comunidade São Remo, vizinha à Cidade Universitária na Zona Oeste de São Paulo.

Rhaick diz que quer “brigar” para ficar entre os dez primeiros. “Quando estou competindo, eu penso em completar a prova, dar o meu melhor em cada segundo. Me sinto honrado em representar o Brasil numa competição grande como essa. É uma responsabilidade imensa também”, diz o atleta, que recebe o Bolsa-Atleta e divide seu tempo entre os treinos e o terceiro ano do Ensino Médio. O que o motiva? “Acho que tenho potencial e gosto do esporte. Minha mãe me ajuda também. Quando estou desanimado, ela pede para eu treinar”, conta ele.

Equipe brasileira posa junto com mascote dos Jogos
Além de Taynara, Michael e Rhaick, há outros nove jovens levando o nome do Brasil aqui na Suíça: Noah Bethonico (snowboardcross), Manex Silva (esqui cross-country), Eduarda Ribera (esqui cross-country), Lucas Carvalho (skeleton), Larissa Cândido (skeleton), Gustavo Ferreira (monobob), Gabi Farias (curling), Vitor Melo (curling) e Leticia Cid (curling). Metade deles mora fora do Brasil. COB

O importante é evoluir  

O swissinfo.ch conversou também com Matheus Figueiredo, indicado pelo Comitê Olímpico Brasileiro (COB) como chefe da Missão Brasileira nos jogos de Lausanne. Ele destaca que o maior número de atletas nessa edição é um dado importante, mas diz também que já há uma evolução dos resultados nas modalidades de inverno. E a ideia é continuar nessa linha. “Hoje, estamos competindo em algumas modalidades, não só participando, como no monobob e no snowboardcross. Antes, eram poucos jovens praticando. Mas cada vez mais, os esportes de inverno estão sendo conhecidos no Brasil e praticado pelos jovens. É um processo”, diz ele.

 

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