Justiça pede a prisão preventiva de suíços no Brasil
Acusados de tomar parte em um esquema de remessa ilegal de dinheiro que movimentou cerca de R$ 1 bilhão entre o Brasil e a Suíça, os suíços Luc Marc Depensaz e Reto Buzzi ficarão presos na Polícia Federal de São Paulo por tempo indeterminado.
O esquema foi supostamente montado pelos bancos em que os suíços trabalham – UBS e Clariden Leu, controlado pelo Crédito Suíço.
O encerramento dos dez dias de prisão temporária _ período máximo estabelecido pela lei no Brasil _ na última quarta-feira (14) fez com que o juiz Fausto de Sanctis, da 6ª Vara Criminal Federal, pedisse a prisão preventiva dos dois suíços. A alternativa seria o relaxamento da prisão.
Além de Depensaz e Buzzi, outras sete pessoas tiveram sua prisão preventiva decretada pela Justiça brasileira. Entre elas está um terceiro cidadão suíço, Marc Henry Dizerens, também funcionário do UBS, que é considerado foragido e, segundo a Polícia Federal, já se encontra na Suíça. Além dos dois suíços, permanecerão detidos alguns empresários e doleiros envolvidos no esquema.
O juiz Fausto de Sanctis não deu entrevista sobre o caso, mas fontes na Polícia Federal informam que as investigações apontam para a “participação plena e consciente dos bancos UBS e Crédit Suisse (que controla o Clariden Leu) na montagem do esquema”. Esse fato foi determinante para a decisão de manter Buzzi e Depensaz presos enquanto as investigações avançam.
Segundo a PF, a Operação Kaspar 2 colheu evidências da colaboração entre funcionários do Crédit Suisse e do UBS com Claudine Spiero, que seria a principal doleira do esquema e também se encontra presa em São Paulo. As investigações apontam que o escritório “private banking” do Crédit Suisse na capital paulista organizou uma reunião em um hotel do balneário de Punta Del Este, no Uruguai, para apresentar à doleira clientes brasileiros de alto poder aquisitivo.
A reunião no Uruguai, de acordo com as investigações, aconteceu logo após a libertação de Peter Schaffner, diretor do Crédit Suisse que ficou preso por cinco meses no Brasil. Schaffner foi detido em março do ano passado, quando tentava deixar o país, sob acusação de utilizar o escritório do banco na Avenida Brigadeiro Faria Lima para abrir contas numeradas na Suíça e efetuar depósitos para clientes brasileiros sem declarar ao Banco Central.
Mudança de Tática
Segundo as investigações coordenadas pelo delegado Renato Saadi, a prisão de Schaffner fez com que o Crédit Suisse mudasse de tática e passasse a privilegiar o envio de gerentes da matriz ao Brasil, onde estes começaram a fazer diretamente a intermediação entre os clientes brasileiros e os doleiros. O mesmo procedimento, segundo a PF, era adotado pelo UBS, e ambos os bancos mantinham contato com Claudine Spiero.
Era este trabalho de intermediação que estariam fazendo no Brasil os suíços Reto Buzzi e Luc Marc Depensaz no momento de suas prisões. O mesmo vale para Marc Henry Dizerens, que conseguiu escapar. Conversas telefônicas gravadas pela PF com autorização judicial revelaram vários contatos entre Spiero e os funcionários do UBS e do Crédit Suisse.
Numa conversa entre Spiero e Depensaz, gravada no dia 26 de setembro, a doleira chega a dizer que havia se desentendido com o Crédit Suisse e que, por conta disso, faria com que “todos os seus clientes” migrassem para o UBS. Segundo o revelado pela PF, todas as conversas entre Depensaz e Spiero falam aberta e claramente sobre as remessas ilegais de dinheiro para o exterior.
Residência fixa
Para o advogado de Luc Marc Depensaz no Brasil, Eduardo Carnelós, ainda existe esperança de ver o suíço em liberdade nos próximos dias. Para tanto, ele encaminhou na segunda-feira (19) ao Tribunal Regional Federal da 3ª Região, onde corre o processo, um pedido de hábeas corpus para seu cliente: “Estamos aguardando também a análise de um pedido de liminar que determina a soltura imediata”, disse o advogado.
A possibilidade de fuga, segundo Carnelós, não deveria pesar na decisão da Justiça: “Meu cliente já informou que não tem a menor intenção de deixar o Brasil até que tudo seja esclarecido. Além disso, o fato de poder sair do país não é o motivo para que não o libertem”, diz.
Até então distante do caso, o UBS decidiu alugar um apartamento para Depensaz em São Paulo, o que pode contribuir para sua soltura: “Assim, ele terá residência fixa no país e poderá responder tranqüilamente a todo o processo”, explica Eduardo Carnelós. Procurada pela reportagem de swissinfo, as filiais do bancos Clariden Leu e Crédit Suisse no Brasil não se manifestaram a respeito da situação de Reto Buzzi.
swissinfo, Maurício Thuswohl, Rio de Janeiro
Desbaratado pelas operações Kaspar 1 e 2, organizadas pela Polícia Federal no Brasil, o esquema de remessa ilegal de dinheiro para a Suíça envolvendo doleiros, empresários brasileiros e funcionários dos bancos UBS e Crédit Suisse/ Clariden Leu movimentou, segundo o apurado nas investigações, quase US$ 600 milhões ou R$ 1 bilhão.
O sistema de compensação utilizado pelo esquema era o conhecido como “dólar-cabo”, através do qual os doleiros no Brasil, com a conivência dos bancos, depositavam o dinheiro não-declarado em contas numeradas na Suíça.
Se porventura o dinheiro depositado precisasse voltar o Brasil, o mesmo esquema era repetido. Uma alternativa também utilizada pelo esquema, segundo as investigações, foi o envio ao Brasil de mercadorias subfaturadas no valor dos montantes depositados.
Ao todo, vinte e duas pessoas foram detidas pela PF nos últimos dias, entre empresários, doleiros e funcionários de bancos estrangeiros. Além dos bancos suíços, o banco AIG, dos Estados Unidos, também tomou parte no esquema de remessa ilegal de divisas.
Assim como no caso do UBS e do Clariden Leu, a funcionária do AIG foi detida, mas sua prisão preventiva não foi pedida pela Justiça.
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