Projetos cada vez mais extremos para o Jungfrau
O Jungfraujoch, um dos locais mais visitados da Suíça, deverá em breve ser ponto de partida de uma nova linha de trem subindo até 3.700 metros.
É necessário fazer tantos sacrifícios pelo turismo de massa? Um observador privilegiado coloca questões que incomodam.
“Dentro de alguns anos, as massas escalarão o cume. Lá onde reina hoje em dia um silêncio cerimonioso haverá assobios e ruídos”. A crítica, feita por um membro do Clube Alpino Suíço, referia-se ao Jungfrau e data de 1894. Seu autor rejeitava claramente o projeto de construção de uma linha de trem até o Jungfraujoch, um passo entre as montanhas Mönch e Jungfrau nos Alpes bernenses, para a qual o industrial zuriquense Adolf Guyer-Zeller acabava de entregar um pedido de concessão ao governo federal.
Mas, como lembra a Companhia de Trens do Jungfrau (JBH, na sigla em francês) na sua documentação para o centenário da inauguração do trem, as críticas seriam limitadas a um grupo restrito de pessoas. O entusiasmo dos habitantes dos Alpes bernenses para um projeto que garantiria, aos seus olhos, o turismo no vale, acabaria sendo aprovado. A linha foi então inaugurada em 1° de agosto de 1912.
O centésimo aniversário
Foi ao anunciar as festividades organizadas pelo centésimo aniversário que a JBH revelou seus projetos futuros. “Nós precisamos continuar sendo atraentes para os novos mercados”, explicou o diretor Urs Kessler durante uma coletiva de imprensa no final de agosto em Zurique. Os turistas asiáticos, sobretudo os oriundos do Japão, Coréia do Sul e Índia, são os primeiros a serem citados.
Uma nova estação de chegada receberá os turistas a partir do final de fevereiro de 2012 e, a partir de 1° de abril, uma nova galeria com escada rolante será inaugurada. “Não podemos propor excursões a pé a todos os turistas asiáticos”, reforça Kessler.
“O conforto dos turistas é apenas um pretexto”, reage Benedikt Loderer, arquiteto, escritor, fundador da revista “Hochparterre” e também observador de tudo o que diz respeito à modificação da paisagem na Suíça. “O que os promotores querem é que os turistas sejam mais rápidos, para que possam receber um número cada vez maior.”
A empresa JBH não nega que um dos quesitos no projeto também é a velocidade, mas uma velocidade de outro tipo. “Os turistas não têm mais o mesmo orçamento em tempo e finanças como no passado”, retruca Urs Kessler. “Eles querem ver mais coisas em um tempo limitado.”
Escada rolante
A escada rolante, dentro de um túnel, passará entre as explicações sobre a construção da linha e sobre o desenvolvimento do turismo alpino. Ela permitirá também melhorar a fluidez dos movimentos. “Teremos dessa forma um percurso circular”, explica o diretor. “Hoje os turistas vão e voltam do ‘Palácio do Gelo’ (n.r.: galeria construída em uma geleira) e o terraço pelo mesmo caminho”. A nova galeria está orçada em 16 milhões de francos.
Mas a companhia do Jungfraubahn quer ir ainda mais longe. Em 2015 ou 2016, uma extensão do trem a cremalheira deve levar os visitantes até um ponto mais alto da montanha localizado a 3.700 acima do nível do mar, o “Ostgrat”, ocupado atualmente por uma estação da empresa de telecomunicações Swisscom, que prevê abandoná-lo a partir de 2013.
Diversão
“Estamos preparando uma atração que será tão interessante como a pintura da Mona Lisa em Paris”, anuncia Urs Kessler. Um concurso de arquitetura será lançado. Em abril passado, a companhia não havia excluído aumentar as tarifas para financiar seus projetos.
Enquanto os objetos decorativos e outros brindes, como vacas coloridas, do Jungfraujoch não chegam a agradar a todos, se o local oferece aos visitantes um filme do panorama local caso o tempo esteja muito encoberto, a questão da pertinência desses projetos em relação à “natureza bruta” podem ser legitimamente colocada.
Benedikt Loderer analisa de forma crítica essa evolução. “As margens de lucro diminuem e os responsáveis desses lugares turísticos precisam oferecer mais. Na era do ‘funitis’ (n.r.: traduzido por mania de diversão), o puro prazer da natureza não é suficiente, especialmente quando cresce a concorrência entre a neve e a praia para atrair os turistas.”
No entanto o principal objetivo é “atrair as massas”. A beleza das montanhas correria o risco de ser prejudicada? “Em minha opinião ainda estamos longe disso. De todas as maneiras, as reflexões dos protetores da natureza não têm nenhuma importância em relação aos debates sobre o turismo”, critica Benedikt Loderer. “A montanha Cervino continua muito bonita mesmo se o vilarejo do Zermatt está cheio de horríveis blocos habitacionais.”
Turismo sustentável
A discussão sobre o “turismo sustentável”, com infraestruturas compatíveis com a proteção da natureza, cresce. Benedikt Loderer não concorda. “É um discurso desesperado, que não diz respeito à zona situada no limite das quedas de neve. Acima dos 1.500 metros esse discurso não tem peso.”
Enfim, para o observador, uma “sociedade a duas velocidades” já começou a se firmar nos Alpes: “Os grandes centros vão se desenvolver e os pequenos vão perder espaço. Ora com a mudança de utilização dos lugares de altitude média, nós corremos o risco de ver o reaparecimento da pobreza. Mas ninguém se questiona se seria grave ver surgir regiões baldias nos Alpes, vilarejos abandonados nos locais onde a neve não cai mais.”
Sobre ver se nos Alpes bernenses, o desenvolvimento do projeto do novo trem à cremalheira suscitará as mesmas críticas que em 189. Essas críticas, que continuaram minoritárias face ao entusiasmo nascido do lançamento do serviço de trem e da estação mais elevada da Europa, existem há quase cem anos.
A Jungfraubahn é uma linha ferroviária nas montanhas do cantão de Berna. Ela parte da localidade de Kleine Scheidegg, passa pelos montes Eiger e Mönch e segue até o cume do Jungfraujoch, superando uma diferença de altitude de 1.400 m num trajeto de 9 km.
Os primeiros projetos para uma ligação até o Jungfraujoch fracassaram por volta de 1860. Em 1894, o industrial Adolf Guyer-Zeller obteve do Conselho Federal (governo) uma concessão para construir a ferrovia.
Dois anos depois, começaram as obras da linha de trem a cremalheira, encravada nas rochas. Muitos trabalhadores italianos participaram da construção.
Em 1912, foi inaugurada a estação ferroviária mais elevada da Europa, a 3.454 metros de altitude. Os custos da obra foram estimados à época em 14,9 milhões de francos.
Aproximadamente 700 mil pessoas sobem ao Jungfraujoch anualmente para apreciar a vista sobre a geleira do Aletsch, tombada como patrimônio da humanidade pela UNESCO, além de admirar o cenário alpino.
No primeiro semestre de 2011, os lucros da companhia Jungfraubahn (JBH) aumentaram em 23,9% em relação aos primeiros seis meses do ano passado, chegando a 11,2 milhões de francos.
Cerca de 313.600 pessoas estiveram no Jungfraujoch, ou seja, 48.500 a mais do que em 2009.
A Ferrovia do Jungfrau aproveitou da fraqueza do euro em relação às moedas asiáticas: as viagens na Europa se tornaram baratas para os turistas asiáticos e um passeio ao Jungfrau continua sendo uma das grandes atrações, apesar do franco valorizado.
Adaptação: Alexander Thoele
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