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“Trabalhar com Federer não era nada fácil”

Roger Federer durante o 'Orange Bowl' de Miami, em 1998.

Por ocasião do último Grand Slam do ano, o US Open, que começa no dia 31, swissinfo.ch entrevistou Paul Dorochenko, um dos primeiros treinadores de Roger Federer.

Ele contou alguns segredos do grande campeão suíço do tênis.

Paul Dorochenko é uma das pessoas no mundo que melhor conhece Roger Federer. Ele foi um dos seus primeiros preparadores físicos quando o campeão suíço tinha apenas 17 anos. De 1998 a 2000, ele trabalhava com as jovens esperanças do tênis helvético nas instalações da Federação Suíça de Tênis em Bienne, a poucos quilômetros da capital Berna.

swissinfo.ch: Como começou seu trabalho com Roger Federer?

Paul Dorochenko: Na época eu já treinava o espanhol Sergi Bruguera e o suíço Marc Rosset. A Federação Suíça de Tênis tinha me convidado em 1998 ser preparador físico e fisioterapeuta no centro nacional de tênis em Bienne. Neste momento o Roger Federer precisava de alguém para ajudá-lo a melhorar suas condições físicas.

Quais são suas lembranças desse período em companhia dos jovens atletas e, especialmente, do atual número 1 mundial?

Roger Federer era bem dotado tecnicamente, mas ainda precisava melhorar sua mobilidade na quadra. Era um garoto hiperativo, com uma forte personalidade. Ele não parava de fazer brincadeiras. Seu bom humor e sua energia nos contaminavam. Mas antes de tudo, era uma boa pessoa. No centro nacional de Bienne, ele era amigo de todo mundo.

Para mim ele era quase um filho. Tínhamos uma relação bem particular. Algumas vezes ele comia lá em casa. Eu mesmo lhe emprestei a minha casa em Biarritz para que ele passasse férias. Mas trabalhar com ele não era muito fácil.

Por que?

Roger Federer esgotou minhas energias em apenas três anos. Depois desse tempo passado na Suíça, eu estava cansado e decidi ir à Barcelona para treinar mais uma vez Sergi Bruguera. Roger Federer também saiu da Federação e começou a trabalhar com o preparador físico Pierre Paganini (ndr:Paganini treina Federer até hoje).

Não era evidentemente fácil trabalhar com o Roger, pois ele era pouco pontual, chegava atrasado aos treinos e era constantemente necessário insistir para que ele começasse a trabalhar. Ele não era muito esforçado e se cansava rapidamente, pois realizava os exercícios com uma enorme facilidade. Porém, apesar de tudo, ele se esforçou bastante para ter sucesso.

Uma das facetas mais importantes no preparo de atletas profissionais é o aspecto psicológico. No caso de Federer, a sua hiperatividade era difícil a gerir?

Todos os planos de treino eram baseados no autocontrole. Por exemplo, eu programei para ele longas sessões de resistência. Federer devia aprender a lutar contra ele mesmo para chegar a um melhor controle mental. A Federação também contratou um psicólogo esportivo para completar a equipe técnica.

Eu me lembro das punições que a gente aplicava nele nos momentos em que jogava para o alto a raquete ou perdia o seu autocontrole. Nesses casos ele tinha de limpar as marcas amarelas deixadas pelas bolas na superfície das quadras da com ajuda de uma máquina. E isso a partir das sete horas da manhã, muitas vezes sob um frio de rachar os dentes.

Na época você imaginava que ele se tornaria num dos maiores jogadores da história do tênis?

Obviamente que não. Eu nunca imaginei que tinha sob o meu comando o futuro “ás” do tênis mundial. Mas a gente já sabia que ele tinha alguma coisa a mais do que os outros e seu nível era excelente.

Ele sempre dizia que queria se tornar o número um mundial. Poderia parecer arrogante, mas tudo já estava claro para ele. Naquele momento, ele não tinha nem ranking ou pontos da classificação da ATP. E somente um ano e meio depois, ele teve uma progressão extraordinária. Além disso, ele chegou a ser escolhido como a melhor esperança do esporte suíço ao final da nossa colaboração.

Eu nunca imaginei que ele ganharia um dia em Roland-Garros. Mesmo se os especialistas do saibro continuam derrotando-o, Federer se sente, de fato, à vontade em qualquer tipo de piso.

Qual é o segredo do sucesso de Federer?

Não existe sucesso sem trabalho. Ele investiu muitas horas de preparo na coordenação, na força e em suas condições físicas. No quadra ele parece bem rápido, mas possui uma coordenação espetacular. Mesmo que alguém já nasça com talento, isso não seria suficiente para torná-lo um campeão.

Roger Federer possui um corpo perfeito para jogar tênis. Ele faz tudo direito e economiza seus movimentos de forma ideal. Eu ensinei a ele seu esplêndido jogo de pernas depois de ter jogado várias vezes contra o Sergi Bruguera na terra. Outro fator do seu sucesso está na sua grande estabilidade emocional, que ele sempre teve. Ele não mudou muito no passar dos anos. Ele aproveita de uma vida familiar estável e quase sempre trabalhou com o mesmo treinador. Sua mãe foi também uma grande ajuda para que ele ganhasse essa estabilidade.

Você acredita que ele irá conquistar outros títulos no Grand Slam antes de se aposentar das quadras?

Ele pode ganhar outros grandes torneios nos próximos anos, isso é certo. Suas chances serão grandes em Wimbledon, mesmo se a cada ano será mais difícil de conquistar o troféu. Eu acredito que o Federer era melhor há dois ou três anos. Atualmente, além de Nadal, já existem outros grandes rivais no circuito como Andy Murray e Novak Djokovic.

Em minha opinião, ele pode ganhar um 17° ou 18° título no Grand Slam antes da aposentadoria. Ele não terá problema para jogar no mais alto nível até, pelo menos, completar seus trinta anos.

Ivan Turmo, swissinfo.ch

Paul Dorochenko, 55 anos, é preparador físico e fisioterapeuta nascido na Argélia. Possui a nacionalidade francesa.

Ele foi um dos pioneiros na preparação física no mundo do tênis. Durante sua carreira, Dorochenko trabalhou com jogadores como os suíços Jakob Hlasek e Marc Rosset, e os espanhóis Sergi Bruguera e Carlos Moya.

Desde 2006, dirige o Centro Internacional de Reabilitação Esportiva em Valência. Seu desejo é criar outros centros semelhantes na Espanha.

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