Socióloga pesquisa brasileiras na Suíça
A experiência das mulheres brasileiras que emigraram para a Suíça é muito mais complexa do que é veiculado pelos clichês habituais.
Para uma tese de doutorado na Universidade de Fribourg, a socióloga Giuditta Mainardi entrevistou mulheres brasileiras. O livro será publicado nos próximos meses, pela Editora Peter Lang.
A obra Espelhos migratórios: a experiência de mulheres brasileiras na Suíça deve chegar às livrarias suíças nos próximos meses. O objetivo da tese de doutorado de Giuditta Mainanardi, concluída na Faculdade de Ciências Econômicas e Sociais da Universidade de Fribourg, era saber qual imagem que as mulheres imigrantes têm delas próprias.
A pesquisadora escolheu as mulheres brasileiras, pois também conhece o país através do trabalho na organização não-governamental suíça “Terra dos Homens. swissinfo entrevistou Giuditta Mainanardi:
O que levou você a escrever uma tese de doutorado sobre mulheres brasileiras na Suíça?
O que me interessava mais era conhecer melhor a realidade delas na Suíça, especialmente para quebrar um pouco o estereótipo de que as brasileiras chegam aqui para trabalhar só como dançarina de cabarés ou na prostituição. A realidade é muito mais complexa!
Por que as brasileiras vêm para a Suíça?
Por várias razões. Algumas se casam com suíços, outras vêm clandestinamente e geralmente trabalham como domésticas; há ainda as que têm alta qualificação profissional e também as que realmente vêm para atuar nos cabarés e a na prostituição.
Que metodologia foi usada nesse trabalho?
Eu entrevistei brasileiras em três das quatro regiões lingüísticas da Suíça e analisei os resultados. O objetivo é procurar entender o sentido que cada uma atribui a ato de migrar, os fatores que influenciaram a decisão de emigrar e o processo de integração no novo contexto.
Há diferenças de percepção em cada região da Suíça?
Houve diferenças na maneira como elas me percebiam. Eu mesma venho do sul da Suíça, onde se fala o italiano. Lá, as brasileiras me diziam que as pessoas eram abertas “super legais”, etc. Nas entrevistas feitas nas regiões de língua francesa e alemã, elas me diziam – “ah, você nos entende porque teve problemas para aprender a língua e se adaptar como nós”. Ou seja, na minha região eu era vista como suíça e nas outras era vista como imigrante.
Os problemas que as brasileiras enfrentam são similares?
Não se pode generalizar. A percepção que elas têm depende muito do nível sócio-econômico-cultural. A mulher que chega como dançarina de cabaré, encontra um suíço que diz que vai “tirá-la dessa vida” e se casa, vai encontrar uma realidade muito diferente de outra que estudou na Europa e conheceu o marido na universidade.
No primeiro caso, geralmente existe uma relação de poder porque a mulher tem menos recursos materiais. No segundo caso, a mulher pode ser mais independente e livre.
Não estou querendo dizer que as mulheres mais humildes não podem ser livres. O que eu vi é que alguns suíços que se casaram com brasileiras se sentem o salvador delas. Então eles constroem uma relação baseada na idéia de que elas terão de estar agradecidas por toda a vida.
Como elas se sentem como mães na Suíça?
Muitas dizem que na Suíça é mais difícil não só de ser mãe, mas de ser mulher. Elas dizem que no Brasil podiam continuar trabalhando, pois família as ajudava a cuidar dos filhos e no trabalho doméstico. Na Suíça elas se sentem muitas vezes sós e totalmente responsáveis pela educação dos filhos. Se a criança tem problema na escola, é por causa dela. Por isso elas dizem que no Brasil era mais fácil ter independência e que isso não é diretamente ligado à maternidade.
Então porque essas brasileiras se casam com suíços?
A maioria compara o homem brasileiro com o homem suíço. Elas geralmente dizem que os brasileiros são mais “quentes”, apaixonados, se adaptam a todas as circunstâncias, mas não são confiáveis, que não prestam, etc. Dizem que os suíços são mais frios, porém confiáveis. Essa é uma das razões citadas com mais freqüência.
É sabido que muitas pessoas nunca se adaptam perfeitamente e pensam o tempo todo em voltar. O seu trabalho também constatou essa crise de identidade?
Essa é uma questão muito importante, principalmente para as mulheres que estão criando os filhos sozinhas. Elas dizem que gostariam muito de voltar, mas por outro lado, acham que ficar aqui é melhor para o futuro dos filhos. Tem a questão da formação, porém no Brasil também existem boas escolas. Quase todas falam da questão da segurança, que o Brasil tornou-se muito perigoso e essa é uma das razões que as fazem ficar: proporcionar aos filhos uma vida mais tranqüila.
swissinfo, Claudinê Gonçalves
Giuditta Mainardi é formada em Psicologia Clínica e doutora em Sociologia pela Universidade de Fribourg.
Trabalha na ONG suíça Terra dos Homens e na Alta Escola de Trabalho Social de Fribourg.
Espelhos migratórios entre o Brasil e a Suíça é uma tentativa de compreensão científica do fenômeno migratório através da própria experiência das mulheres.
Foram feitas entrevistas individuais e aplicadas duas teorias (interacionismo simbólico e “grounded theory”) para verificar o impacto da migração na vida das brasileiras.
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