O que Doris Leuthard quis realmente dizer
A ministra Doris Leuthard anunciou que sairá do governo até o final do ano. O anúncio foi feito à imprensa na quinta-feira (27.09) pela manhã "emocionada" e "lutando contra as lágrimas", aos jornalistas presentes na coletiva.
Agora espera-se as lágrimas nos olhos da Helvetia, a figura mítica do país, não turbem a realidade descrita pela ministra com mais tempo no cargo entre seus pares: “Nosso país está bastante forte, mas se tornou também mais vulnerável”. O que ela lembrou foi a interdependência internacional da Suíça.
Temas se tornaram mais complexos
Forças políticas externas exercem uma grande influência na política interna, acrescentou Leuthard. “É uma falácia acreditar que podemos controlar tudo sozinhos”. A Suíça está exposta à muitos fatores externos. O Conselho Federal (Poder Executivo) assim como o Parlamento Federal têm de conseguir administrar melhor temas complexos e saber conjugar essas influências externas sobre o nosso país na procura de soluções aos problemas.
Leuthard apela aqui à uma nação que reconheceu bem cedo o que se tornou necessário em um mundo globalizado: o valor das relações, a importância de transmitir uma imagem de união e também de confiabilidade. Como um país formado a partir da união de quatro regiões linguísticas, a Suíça soube equilibrar a luta por interesses e encontrar uma balança entre os diferentes aspirações e culturas.
A Suíça criou condições estruturais que podem ser ampliadas nesta base comprovada. E apesar de bastante ambivalente, um dos pontos fortes da do país reside no intercâmbio intercultural. A Suíça tem uma tradição naquilo que o mundo globalizado exige hoje de outros países. Aqui ela teve um papel pioneiro. Tempi passati?
“Exclusividade não é um monopólio suíço”
A Suíça se denominou há muito tempo com um caso único na história. Isso se espelha em uma insegurança em relação aos desafios globais. Porém outra mulher também colocou o país frente a um espelho há pouco tempo, uma mulher com um peso internacional: Plassnik, embaixadora da Áustria na Suíça e ex-ministra das Relações Exteriores. Ela afirmou claramente que “se é muito difícil para um país reconhecer que também outros possam ter um bom sistema político, este fica menos motivado a participar na procura de soluções aos grandes problemas europeus do futuro”.
E ela ainda acrescentou: “Exclusividade não é um monopólio suíço. Cada um dos 193 membros das Nações Unidas também se considera exclusivo, o que é do seu direito. Ou seja, eles também se consideram únicos, seja o Afeganistão ou o Zimbábue”. Essa declaração não pode ser vista apenas como crítica, mas também nos deveria abrir os olhos, especialmente pelo fato de ter sido feita por uma embaixadora ao país onde serve, o que é visto nos círculos diplomáticos como a quebra de um tabu.
Uma coisa é certa: a globalização, essa interconexão internacional cada vez mais densa, redistribui oportunidades e riscos, às vezes a uma velocidade de tirar o fôlego. A multinacional farmacêutica Novartis cortou dois mil empregos na Suíça. Emoções não são levadas em conta nesse caso. A China abraçou há muito tempo a Suíça. O alerta feito pela ministra Leuthard deve ser entendido como um aviso: não é fácil para a Suíça participar, pois embora faça parte do bloco ocidental, não é membro da União Europeia, G20 ou mesmo da OTAN.
Em outras palavras: uma visão global da Suíça e suas conexões internacionais deveria ser há muito uma estratégia de sobrevivência. Essa interdependência internacional cada vez mais densa da economia, política, ciência e cultura determina o futuro da Suíça. O que resta?
O que resta é a educação é o “softpower”
O que permanece são os recursos como a educação e sua aplicação em termos de inovação. E o chamado “softpower”. Independência e credibilidade, segurança e estabilidade, participação e democracia, o Estado de Direito: esses são os pontos fortes dados à Suíça através da sua história. Eles não nos fazem únicos, mas a identidade política da Suíça responde às condições necessárias para que ela possa ter um papel de importância na comunidade internacional
E o papel da imprensa livre não pode ser exagerado. O que Doris Leuthard realmente queria nos dizer foi, provavelmente, menos de um agradecimento: Vamos usar a nossa independência como uma força e poder. E vamos usá-la rapidamente.
Adaptação: Alexander Thoele
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