Gol de chocolate na boca dos brasileiros
Um confeiteiro suíço encanta os chocólatras de Brasília com bombons feitos com frutas exóticas como pequi ou umbu. Apaixonado por futebol, ele aproveita da Copa do Mundo para transformar a mascote Fuleco em uma versão comestível. Porém se junta ao grupo dos insatisfeitos com os gastos nas grandes obras.
O último encontro ocorreu há nove anos (ver reportagem “Um chocolateiro no Planalto”), mas Franz Xaver Odermatt, 68 anos, parece não ter mudado. Cabelos brancos, um bigode fino abaixo do nariz pronunciado, magro e a mesma voz baixa, quase tímida, mas um humor afiado são percebidos nesse suíço radicado há quatro décadas no Brasil.
O repórter da swissinfo.ch senta com o mestre chocolateiro na loja aberta há oito anos em uma rua comercial de Brasília. “Stans chocolates” está escrito na fachada, pintada com a cor da deliciosa guloseima. O nome vem da sua cidade natal, localizada nas proximidades de Lucerna, no centro da Suíça. Depois de trabalhar por muito tempo como sócio de uma confeitaria e depois produzindo de forma independente chocolates e confeitos, ele pensou em aposentar, mas foi impedido pelas filhas, Prisca, 36, e Denise, 38. A primeira, arquiteta formada, projetou a loja e a outra a administra hoje. A ideia deu certo.
Poucos dias antes da Páscoa, a família inteira se juntou às vendedoras para conseguir dar conta de atender a grande quantidade de clientes que chega a cada minuto. Os chocolates da Stans já são famosos. Segundo o jornal Correio Braziliense, uma pesquisa eletrônica mostrou que os leitores os escolheram como um dos melhores da capital. Frente ao caixa, um comprador segura três ovos nas mãos e conta que seus filhos farão a festa. “É o nosso ovo especial com seis camadas, inclusive com creme de castanha de caju, macadâmia e chocolate amargo”, revela Odermatt provocando a gula das pessoas próximas.
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Um chocolateiro no Planalto
Uma vida brasileira
O chocolateiro continua produzindo em casa. Hoje é fornecedor exclusivo da loja das filhas, casadas hoje com brasileiros e completamente integradas na vida local. Questionado sobre a vida no país, Odermatt para alguns segundos para refletir. “Para mim não mudou muita coisa, mas o Brasil mudou muito”. Em que direção? “Eu estou achando que o país piorou muito. Está cada vez mais apertado com os impostos. O governo está precisando de dinheiro”, lamenta.
Porém com o Brasil, ele parece estar em paz. Uma vez por semana reúne-se com outros compatriotas em um bar local para falar da vida. Nas horas livres fotografa flores. “Gosto muito das plantas do Cerrado”, afirma Odermatt, que possui também um pequeno “casebre” em uma região rural, onde costuma caminhar por horas. Vez ou outra faz viagens através do Brasil para conhecer novos lugares. “No carnaval estive em Palmas, um lugar que parece até uma Brasília melhorada, toda retangular.”
A Stans vende hoje 40 tipos de bombons, com recheios variados. Apaixonado pelos sabores das frutas nativas, Odermatt pesquisou e conseguiu desenvolver receitas com jabuticaba, açaí, guaraná, cupuaçu, umbu e até maracujá da caatinga. A fama de “mago do chocolate” chegou até os ouvidos do Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas (Sebrae), que o convidou para escrever um livro, publicado em 2012, com outra cozinheira brasileira sobre diferentes combinações de chocolate com frutas brasileiras. “Do sul ao extremo norte podemos contar com produções de frutas dos seis biomas, em épocas distintas e com sabores únicos”, declara no editorial.
Exportá-los para a Suíça, o país dos chocólatras, sempre ávidos por novidades? Odermatt balança a cabeça, como se quisesse ressaltar a sua experiência de vida. “Os que experimentam nossos bombons adoram, mas os trâmites burocráticos e o transporte são coisas muito complicadas”, retruca. Em si, ele já está bem orgulhoso de ter conquistado a clientela em Brasília. Uma das suas maiores honras foi ter atendido presidentes. “Fiz duzentas e cinquenta tortas para o banquete na posse do presidente Geisel. Depois disso as coisas deslancharam para mim.”
Taça em chocolate
Perguntado se ficou feliz quando o Brasil foi escolhido para sediar a Copa do Mundo, se mostra contrariado. “De forma nenhuma. Quando vi todos aqueles políticos brasileiros sorrindo na sede da FIFA em Zurique, pensei comigo mesmo: o choro vem depois”, afirma, considerado que, em sua opinião, o aspecto mais crítico são os gastos excessivos com a construção de estádios em um país, “onde falta tanta coisa”.
Política a parte, o que mais lhe interessa é juntar o futebol com o chocolate. Torcedor do Palmeiras desde que viveu em São Paulo nos anos 1960, Odermatt criou o “Chocoleco”, uma versão comestível da mascote da Copa do Mundo de 2014, o Fuleco. Além disso, também criou apitos de chocolate e uma bola de chocolate recheada com outras pequenas bolinhas. E mesmo na Páscoa, o coração de torcedor não deixou de bater: ele vai a uma prateleira e pega nas mãos o “ovo da Copa”, embalado em uma caixa de plástico com uma fita em verde-amarelo. Nas laterais do ovo, bolinhas em chocolate nas cores nacionais. Difícil para ele é esperar até que a seleção suíça venha jogar no Mané Garrincha em 15 de junho. “Já comprei até os ingressos”, brinca.
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