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Um português entre os “maus” garotos

Tiago Vieira (frente) luta com um adversário durante a festa do Schwingen em Bözberg, 20 de maio de 2015. swissinfo.ch

Quando o inverno dá lugar ao período quente do ano, os suíços se encontram nos descampados para praticar o esporte nacional do país, o "Schwingen". Vestidos com calções de juta, esses lutadores modernos disputam a coroa de louros em uma arena na qual o principal prêmio pode ser até um touro. Um jovem migrante português é um dos poucos estrangeiros a desafiar os campeões. 

Dois jovens colossos entram na arena livre coberta de serragem em um vilarejo no interior da Suíça. Sem provocações desnecessárias, eles apertam as mãos e imediatamente se abraçam. As mãos seguram com firmeza no forte cinto de couro que segura o calção de juta do oponente. Depois que o juiz dá o sinal, a musculatura se retesa e um tenta jogar o outro ao chão. Os golpes são orquestrados com estratégia, como no judô. Um dos lutadores vacila, perde o equilíbrio e cai de costas. Rapidamente se curva para não encostar no chão. O outro joga todo o seu peso, mais de cem quilos, em cima do rival. Este toca finalmente a serragem e o juiz indica a derrota. O vencedor ajuda o colega a se levantar e limpa a sujeira pregada na sua camisa. Mais uma das tradições centenárias do Schwingen, a luta suíça.

Tiago Marques Vieira, 23 anos, é um desses lutadores. Com um metro e noventa de altura e 140 quilos na balança, o atleta de origem portuguesa já ganhou diversos títulos e é considerado um dos mais fortes talentos do cantão da Argóvia, ao norte do país. Porém seu nome salta aos olhos nos torneios, onde a grande maioria dos participantes tem nomes de sonoridade germânica como Matthias Sempach, Arnold Forrer, Jörg Abderhalden ou Kilian Wenger, os campeões atuais e dos anos passados, todos 100% suíços. Poucos esportes são tão tradicionalmente helvéticos como o Schwingen.

Inspiração no wrestling

A paixão começou por coincidência durante a “Maienzug”, uma tradicional festa de verão em Aarau, cidade onde nasceu. “Tinha uns dez anos e estava na festa quando vi uma apresentação de Schwingen. Como era um grande fã do wrestling, achei então interessante tentar”, conta Tiago. Após derrubar vários meninos, o treinador do clube local viu que ele tinha jeito para o esporte e o convidou. “Como era um grande fã wrestling, aceitei e agora já são mais de dez anos que luto.”

Ao seu lado, orgulhoso, o pai, José Domingo Vieira. O português originário de Viana do Castelo, na região do Porto, vive na Suíça desde os anos 1970 e sempre trabalhou na gastronomia. Hoje é dono de um bar e loja de produtos lusitanos na cidade de Aarau. Acima do balcão, visível aos clientes, estão pendurados vários gigantescos sinos de vacas e coroas de louros, todos ganhos por Tiago em luta passadas. No fundo, fotos e recortes de jornais atestam que o filho se tornou uma personalidade no cantão. “Com segurança ele é o melhor Schwinger português da Suíça”, declarou ao canal de televisão da Basiléia, em um programa especial dedicado ao lutador.

Apesar desconhecer completamente o esporte, seu pai apoiou-lhe desde o início. “Ele me levava às lutas nos finais de semana”, conta orgulhoso Tiago. E também a recepção dos membros do Clube de Schwingen da Argóvia foi uma experiência muito positiva. “Ao contrário do caratê, que também já pratiquei, o ambiente no clube sempre foi muito solto e amigo. As pessoas não se importam se sou estrangeiro. O que conta são as minhas qualidades de lutador”. 

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Português disputa um lugar no trono da luta suíça

Este conteúdo foi publicado em À primeira vista, Tiago Marques Vieira não difere muito dos suíços que disputam com ele as coroas de louros nas disputas de luta suíça que ocorrem em várias partes da Suíça, quase sempre regiões rurais, nos finais de semana. O colosso de 23 anos, um metro e noventa de altura e 140 quilos, fala o…

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Contrariamente a muitos esportes, a luta suíça praticamente não possibilita a profissionalização. Mesmo os campeões suíços trabalham a meio-período em suas profissões originais, apesar das verbas publicitárias estarem aumentando nos últimos anos. Depois da escola obrigatória, Tiago fez uma formação de padeiro, uma profissão que exerceu por apenas três anos. E não foi por preguiça. “Era difícil conjugar o esporte com o trabalho de padeiro, onde você acorda às quatro da manhã e tem de dormir tão cedo”, diz. Então se tornou montador de andaimes, que permitia-lhe estar ao ar livre e segurando peso. Foi uma decisão corajosa, mas com riscos. “Depois de exagerar e começar a ter problemas nos ombros, procurei algo mais tranquilo e hoje sou representante comercial”.

O treino é uma parte importante do seu dia. Duas vezes por semana, Tiago vai ao clube para fazer exercícios de musculação, condicionamento, coordenação e até tática. “No Schwingen você tem de aprender a utilizar a sua força, mas também a cair e se virar no chão”, diz. Só depois dos exercícios é que os membros lutam entre si. Os campeonatos ocorrem nos finais de semana. Nas horas livres, o português gosta de encontrar amigos e até assistir futebol, que, uma exceção entre os imigrantes, não é a sua maior paixão. Porém admite que torce para o Benfica.

Cavalo como prêmio

Questionado sobre os títulos conquistados, Tiago pensa demoradamente e começa a listar os presentes. “Já ganhei três televisões, uma bicicleta, dois laptops, viagens, passeios de balão e até um cavalo”, diz, apontando para os troféus pendurados no bar do pai. No Schwingen os prêmios são simbólicos, apesar de muitas vezes terem valores consideráveis. O chamado “Rei do Schwingen” é o melhor lutador dos principais campeonatos recebe geralmente um touro e a coroa de louros. No total, o jovem português conquistou sete coroas de louros e participou de dois grandes campeonatos com bons resultados. Porém o importante são as pequenas vitórias, como a primeira, em 2002, quando o prêmio foi um canivete suíço.

Aos quinze anos, Tiago entrou na categoria de lutadores ativos. A questão da nacionalidade nunca foi importante, apesar de se incomodar quando escuta os erros e pronúncia do seu nome nos alto-falantes dos ringues. A imprensa local sempre ressalta esse diferencial. “Um secondo em cima da serragem”, titulou o Jornal de Berna em maio, fazendo alusão a sua condição de segunda geração de migrantes radicados na Suíça (secondos). Perguntado se gostaria de se naturalizar, o jovem balança a cabeça em negativa. “É um processo muito complicado e caro. Eu não preciso disso, pois falo o idioma local, tenho meus amigos aqui, emprego e sou lutador. Estou mais do que integrado”, responde.

Atualmente Tiago está preocupado em melhorar suas condições. “Preciso treinar mais, talvez passando para cinco treinos por semana, e cuidar da comida”, conta ao pensar nos seus 140 quilos. Ao seu lado, o pai lembra a dificuldade de encontrar um patrocinador que poderia financiar o apoio técnico necessário como fisioterapeutas e preparadores físicos. Porém o português tem muitas esperanças no esporte e não esconde a sua ambição. “Meu sonho é ser o melhor Schwinger da Suíça, não, do mundo.”

Schwingen

Schwingen (alemão) ou “luta suíça” é um esporte típico na Suíça. Apesar de ter semelhanças com o sumô japonês, sua origem não pode ser claramente determinada. Seu primeiro registro histórico é uma imagem datada do século 13, exposta até hoje na Catedral de Lausanne, onde se vê um dos típicos golpes da luta.

Na Suíça central e na planície suíça, especialmente na região dos pré-Alpes, a luta sempre esteve presente nos momentos festivos. Nos textos literários de viagens do século 18, a evocação da luta suíça como exemplo de costumes ancestrais foi amplamente citada.

A luta é realizada num ringue coberto de serragem. O principal objetivo dos dois lutadores é forçar o adversário a tocar com as costas o solo. O uniforme básico é o calção de juta com um cinto de couro e a típica camisa dos camponeses. Os lutadores disputam de uma a seis lutas – nas fases iniciais eliminatórias e depois por pontos. O vencedor ganha uma coroa e prêmios diversos. O campeão suíço é conhecido como “rei da luta” e o prêmio principal é geralmente um touro. 

Atualmente são conhecidos mais de cem diferentes golpes. Normalmente uma luta dura apenas alguns minutos. Os lutadores dificilmente são feridos, mas podem terminar uma competição com algumas escoriações.

A principal competição é a Festa Federal de Luta Suíça, que ocorre de três em três anos. A última ocorreu de 30 de agosto a 1 de setembro de 2013 em Burgdorf, nas proximidades de Berna. Outras competições ocorrem regularmente em níveis regionais e nacionais.

A luta suíça é um esporte tradicionalmente masculino. Porém as mulheres começaram a lutar a partir de 1990. 

Links

Portal da Luta Suíça Link externo

Associação Federal de Luta SuíçaLink externo

Schwingen – Wikipédia em alemãoLink externo

Entrevista com Tiago Vieira na TV da BasileiaLink externo

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